Atos 2 — Gabriela Rocha (Análise da música)
Sempre que analisamos uma música cujo título é uma referência bíblica, a primeira coisa a se fazer é abrir a Bíblia avaliar se a sua mensagem condiz com o texto sagrado.
Neste caso, não específica a quais dos 47 versículos da Atos 2 está falando. Mas, não há dúvidas de que ela fala dos versículos 1–13, que relata a vinda do Espírito Santo no dia de Pentecostes.
O que era o dia de Pentecostes e o que aquele grupo de homens estava fazendo ali?
Primeiro, o dia de Pentecostes (dia também conhecido como a Festa das Semanas, da Colheita ou das Primícias) era uma data comemorativa celebrada no quinquagésimo dia depois da Páscoa. Nele, o povo comemorava e agradecia a Deus pela colheita dos primeiros frutos de trigo (Nm 28:26).
Em Atos 2, particularmente, os discípulos estavam em Jerusalém também à espera da vinda do Espírito Santo, conforme Jesus havia lhes ordenado fazer (At 1:4,5).
E então, com todos reunidos, o Espírito Santo vem como um vento impetuoso e enche toda a casa. E entre eles aparecem “línguas, como de fogo” (At 2:5) sobre a cabeça de todos, que ao ficarem cheios do Espírito passam a falar em línguas. Logo em seguida, Pedro começa a pregar e anuncia que este é o cumprimento da profecia de Joel 2:28–32, que viria acompanhado de sinais e maravilhas.
Com este evento, nasce a Igreja e inaugura-se a Nova Aliança, o período de atuação do Espírito Santo, “os últimos dias”, como afirma Pedro.
Então fica a pergunta: podemos pedir um novo dia de Pentecostes?
Não. Não podemos reinaugurar a igreja ou pedir que Deus reenvie seu Espírito, que já está aqui. Foi um evento único que não pode ser repetido. Logo, no mínimo, o título da música talvez não seja o mais adequado, pois dá a entender que podemos reproduzir o que vimos em Atos 2:1–4.
Agora, como não citamos o título da música toda vez que vamos cantar na igreja, não é tão importante assim. Mas é bom entender desse pano de fundo.
A primeira estrofe descreve um sentimento legítimo e necessário para cristãos, que espelha a expectativa pela vinda do Espírito Santo de Atos 2. Devemos buscar sempre sermos cheios do Espírito Santo e receber poder do alto para anunciar as maravilhas de Deus, como aconteceu no versículo 11.
Em seguida, o refrão faz algumas afirmações que não são erradas, propriamente ditas, mas talvez faltem um pouco mais de definição. Por exemplo, a imagem do fogo no altar provavelmente vem dos sacrifícios do Antigo Testamento e também das línguas “como de fogo” de Atos 2. Acontece que não fazemos mais sacrifícios assim e o “fogo” de Atos 2 é mais uma comparação do que uma constatação.
Para além disso, não vemos na Palavra a ideia do incêndio como algo que faz parte da devoção. Obviamente, por conta do texto de Atos, associamos o fogo ao Espírito, mas não vemos personagens no Novo Testamento pedindo para serem incendiados. Mesmo assim, a partir da imagem das “línguas como de fogo”, conseguimos compreender que isso se refere a uma presença sentida do Espírito Santo.
Outra linha diz “Quero ouvir o som do céu”. A menção que temos do som do céu na Bíblia vem de Apocalipse 14, onde João diz: “Ouvi uma voz do céu como som de muitas águas, como som de forte trovão. A voz que ouvi era como de harpistas quando tocam as suas harpas.” (Ap 14:2)
Então, o que é que estamos pedindo quando dizemos que queremos ouvir o som do céu? Creio que seja uma visão ou imagem de Deus, uma participação do louvor celestial, semelhante ao que vemos em Apocalipse.
Na ponte da música, há um momento de maior exaltação de Deus, afirmando que Dele é a honra, a glória e o poder para sempre.
Chegamos então à pergunta final: esta música serve para o culto cristão?
Eu diria que sim, mas com reservas. Essa música é inspirada num evento único que marca toda a igreja, mas que jamais poderá ser repetido. Por outro lado, ela expressa muito bem o sentimento que devemos ter de sermos preenchidos pelo Espírito Santo, em qualquer reunião de cristãos. Mas, ao fazê-lo, ela não é cuidadosa em explicar os termos e imagens que emprega. Ela chega a cometer nenhum erro doutrinário ou heresia. Mas, falta um pouco de definição sobre qual é a expectativa que devemos ter e que forma isso deve tomar. Essa falta de definição pode muito bem ser suprida na fala do ministro, numa instrução antes de cantar a música. Porém, sem as devidas orientações, deixa margem para muita interpretação.
Creio que esta música cairia bem na reunião de uma igreja que é regularmente instruída pela Palavra. Contudo, numa igreja em que a congregação não tem uma noção clara do que é o dia de Pentecostes, do que podemos esperar, de quem é o Espírito Santo e o que a sua vinda significa, não acho que seja recomendável. Se falamos de poder e fogo sem explicar o que isso significa, por exemplo, pode levar pessoas a criar uma expectativa irreal do que Deus pode e quer fazer.
Considerando que as músicas que cantamos são responsáveis por ensinar boa parte da teologia da nossa igreja, temos que ter cuidado com o quanto elas explicam ou não a Palavra.
Organize o louvor da sua igreja com facilidade!
Com nosso app, você tem acesso a um acervo de músicas bíblicas recomendadas e pode organizar escalas e repertórios com poucos cliques. Baixe agora e experimente!